Nenhuma sociedade humana ignorou a existência das máscaras, que surgiram depois que o desenvolvimento da civilização humana atingiu o estágio da cultura. Na antiguidade, da Grécia à América, através da Ásia e da Oceania, as máscaras simbolizavam os deuses, encarnavam a beleza e o terror, expressavam a ilusão e a imanência, além da calma, da ordem e da serenidade.
Na África, um continente conhecido pela riqueza de sua arte, as máscaras são uma maioria dominante nas artes visuais. A máscara aqui pode ser considerada um fenômeno artístico caracterizado por sua onipresença e a diversidade de suas formas e estilos.
As máscaras são encontradas por toda a África, nas savanas, tanto dos países sudaneses quanto dos países Bantus, nas florestas do Golfo da Guiné e na Bacia do rio Congo, regiões que abrangem diferentes civilizações.
A presença marcante da máscara é independente das características geográficas, culturais, sociais ou políticas. No entanto, existem regiões na África, onde a cultura das máscaras tem uma maior tradição. Como, por exemplo: Sudão ocidental, especialmente os povos Bambara, Dogon, Mossi e Bobo;
Máscara Dogon | Máscara Bambara | Máscara Bobo |
As áreas costeiras, da Casamansa à foz do rio Congo, especialmente os povos da Guiné, Costa do Marfim, Nigéria, Camarões e Gabão;
No Congo, na República Democrática do Congo (antigo Zaire) e em Angola.
Formas das Máscaras
As máscaras são esculpidas em formas variadas, utilizando diferentes materiais, mas com a predominância da madeira clara. Há uma profusão de formas, mas três grandes tendências se destacam.
Máscaras com formas de animais ou máscaras zoomórficas:
Elas identificam as características dominantes dos animais representados pelas máscaras. Por exemplo, as máscaras do povo Bambara, utilizadas durante as danças rituais, que ocorrem em grandes eventos, retratam leões, hienas e antílopes. Da mesma forma, as máscaras utilizadas nas danças rituais dos povos Guro e Baulê, retratam cabeças de cães, cabras, gazelas, búfalos, elefantes entre outros.
Máscaras representando figuras humanas ou máscaras antropomórficas:
Elas são representações de homens ou mulheres. Por exemplo, entre o povo Dogon, as máscaras antropomórficas podem representar os anciões, os sacerdotes, os caçadores ou os feiticeiros.
Máscaras Antropozoomórficas:
Essas máscaras combinam traços de animais e características humanas, mas com a preponderância das características humanas. Assim, ao rosto humano são atribuídos elementos particulares do animal representado, como, por exemplo, chifres, penas, dentes e etc., com o objetivo de realçar as características simbólicas da máscara.
Estilos das Máscaras
Através das formas que dão ao material, os escultores de máscaras se esforçam para tornar visível o invisível e para conseguir expressar suas ideias. A união de elementos naturais e abstratos, bem como de elementos expressionistas e surrealistas, dá origem à essa forma de expressão cultural, que é a máscara. Uma cabeça poderosa, olhos brilhantes, chifres de um búfalo, carneiro ou antílope, às vezes com a boca de um crocodilo, transmite uma impressão de força e poder. O equilíbrio estético, a simetria e a expressão devem evocar a grandeza do contexto sobrenatural, que a máscara quer representar.
Dois estilos se destacam de forma muito clara, através dessa mistura de formas:
- Estilo Cubista, dominado por formas geométricas que é característico das máscaras dos povos Dogon, Bambara, Bobo e We (especialmente o povo Guere);
- Estilo Naturalista que domina a representação do real visível, encontrado nas máscaras dos povos Guro e Baulê, e nos povos do Benin.
Há, ainda, um terceiro estilo, considerado intermediário, encontrado entre os escultores de máscaras dos povos Dan e Senufo, para citar apenas dois exemplos.
Importância da Costa do Marfim
As características geográficas e culturais, e a intensa interação comercial com outros povos, fizeram com que a escultura de máscaras na Costa do Marfim atingisse um elevado padrão estético.
As características culturais dos povos do Alto Níger e da Curva do Niger, aparecem na Costa do Marfim, através da escultura do povo Senufo, que também introduziu neste país certas formas estilísticas dos povos Bambara e Dogon.
Os estilos cubistas e naturalistas, da costa ocidental da África, da Guiné e da Libéria chegaram à Costa do Marfim, através dos povos Dan e We. Essas influências foram disseminadas através da Costa do Marfim pelo povo Guro.
Máscara Guro | Máscara Dan |
O povo Baulê absorveu as técnicas artísticas da região da costa oriental do Atlântico, através dos povos Akan, Adja e Yoruba, e os estilos dos povos Senufo e Guro, fazendo assim uma síntese das concepções artísticas dessa região da África Ocidental.
Máscara Baulê | Máscara Senufo |
Todos esses aspectos contribuíram para a grande riqueza cultural da Costa do Marfim, tornando-a uma das regiões mais importantes na escultura de máscaras na África.
As Funções da Máscara
A escultura de máscaras na África é um fenômeno artístico que, por sua ubiquidade, pode representar um padrão de representação artística, como uma forma de expressão cultural. Isto significa que as máscaras têm um papel de testemunhas do cotidiano e são reveladoras das características da civilização de um povo.
No Ocidente, a ideia de escultura é essencialmente técnica, onde esculpir significa "cortar com um cinzel uma figura ou uma imagem em pedra, madeira ou mármore". Uma das principais características comuns em toda a África, no campo da escultura, é que as máscaras esculpidas não são feitas para serem contempladas como obras arte, mas para serem usadas durante as cerimônias ritualistas, sociais ou religiosas.
A figura que está esculpida na máscara, na realidade representa um personagem, um ser que é ao mesmo tempo uma divindade e uma força da sociedade humana. Quando uma pessoa usa a máscara ela é investida com os atributos dessa força divina e social. As máscaras africanas são identificadas pelo tipo de utilização e importância de suas funções. Essas características também explicam as diferenças no tamanho, forma, roupa, figura e etc ...
Entre o povo Senufo, por exemplo, existem duas grandes classes de máscaras, no que diz respeito à forma, e oito classes, com relação à utilização. Assim, as máscaras de iniciação, como da sociedade secreta Poro, são grandes e com formas de animais. Estas máscaras estão envolvidas na educação e na formação dos homens, portanto, essas máscaras têm uma função positiva. Por outro lado, outras máscaras são destinadas para funções mágicas, tanto para o bem quanto para o mal. Elas são pequenas e têm um rosto humano.
No caso dos povos We e Dan, as máscaras grandes são aquelas que têm uma função de comando, idade e conhecimento. São as máscaras de sabedoria, justiça e guerra.
Em razão do nosso limitado conhecimento sobre a sociedade Senufo, se torna difícil dar uma descrição precisa das funções das máscaras utilizadas por esse povo. O mesmo problema existe com relação aos povos Dan e We. No fundo, o estudo das funções das máscaras, nas sociedades africanas, acaba exigindo uma abordagem diferente da tradicional, como, por exemplo, a utilizada por um pesquisador leigo, sem caráter religioso, que vai coletando, de aldeia em aldeia, informações sobre as estruturas sociais e as instituições.
Desta forma, é possível perceber que, na maioria das regiões, existem vários tipos de máscaras por aldeia, devido as diferentes funções que lhes são atribuídas, em razão das necessidades da vida social, e que a função principal das máscaras é a manutenção da ordem, seja ela no mundo, na sociedade e nas famílias.
Máscaras Yoruba |
Isso significa dizer que a máscara intervém diretamente na recuperação da ordem cósmica, quando esta é perturbada por alguma ação contra as leis do universo. Dessa maneira, quando ocorrem calamidades naturais ou catástrofes humanas, as máscaras indicam os sacrifícios necessários, para reparar os efeitos das transgressões que causaram os problemas. Além disso, devem garantir a correção dos costumes, a fim de que sejam respeitadas as proibições, que estão na base da estrutura das famílias e das aldeias.
Em última instância, as máscaras de sabedoria resolvem os casos, onde a justiça dos homens não consegue resolver a situação que esteja afetando o equilíbrio da sociedade. Sua intervenção nos problemas de guerra e paz também se destina a preservar a ordem social.
Fica claro que os homens necessitam da autoridade dos deuses, espíritos e antepassados, para manter a ordem na sociedade e no mundo. Nesse aspecto, as máscaras encarnam os guardiões sobrenaturais e naturais da autoridade. Elas, portanto, funcionam como recipientes do sagrado e, por consequente, como base para a lei, razão da ordem e do poder.
Assim, a sacralização da autoridade, através de seu investimento na máscara, é uma maneira de garantir a sua legitimidade e poder. Tudo isso nos permite compreender que as máscaras aparecem, portanto, em última análise, como os aparatos ideológicos da sociedade tradicional africana, para assegurar a conservação da ordem natural, buscando o equilíbrio e a luta contra a anarquia. Elas expressam bem a situação das sociedades que buscam não quebrar a continuidade primordial entre o mundo dos homens e o mundo dos deuses, entre o natural e o sobrenatural.